3º Trimestre de 2018
Introdução
I - A Continuidade da Missão de Jesus Cristo pela Igreja
II - Os Fatores Impeditivos dos Milagres
Conclusão
Professor(a), a lição deste domingo tem como objetivos:
Revisar a realização da continuidade da missão de Jesus Cristo pela igreja;
Avaliar os fatores impeditivos dos milagres.
Palavras-chave: Milagre.
Para ajudá-lo(a) na sua reflexão, e na preparação do seu plano de aula, leia o subsídio de autoria do pastor César Moisés Carvalho:
Esta última reflexão poderia ser apenas um libelo contra o cessacionismo. Contudo, ela será mais um grito direcionado ao pentecostalismo que uma defesa do movimento. Isso pela verdade de que, à proporção que o pentecostalismo cresce, é igualmente notório um arrefecimento do seu aspecto carismático, tornando-se cada dia mais institucionalizado e formal. Portanto, reservei este último texto para juntar-me a algumas vozes que ultimamente têm se levantado no afã de bradar, intramuros, que é preciso que o pentecostalismo continue sendo, antes de qualquer coisa, um movimento do Espírito. A fim de manter-se nessa posição, e como parte do modo simples e direto de o pentecostal ler a Bíblia Sagrada, é perfeitamente compreensível que os adeptos do movimento busquem respaldo na Palavra de Deus para sua prática de fé, ou seja, para fundamentar biblicamente o que se vivencia. Um desses textos, no que diz respeito ao exercício dos dons e atuação evangelística do pentecostalismo, é o de Marcos 16.15-20. Conhecido como “fim mais longo”, autores como o teólogo pentecostal, Jerry Camery-Hoggatt, pontua que tal “fim” está demarcado a partir do versículo nove. Ele é taxativo em afirmar que, por não constar o referido texto nos melhores manuscritos, “devemos ter em mente que não tem a autoridade da Escritura, e tomarmos cuidado para não incluir essas observações como fatores na interpretação do próprio Evangelho de Marcos”.1 Ele refere-se especificamente aos “pentecostais e carismáticos”, pois, como se sabe, tais “grupos prestam atenção especial à profecia sobre os sinais milagrosos que acompanham a missão cristã, nos versículos 17 e 18 (cf. também v. 20)”, pois, continua, para “esses leitores, a ‘perda’ do fim mais longo parece diminuir a promessa da Escritura de que a vida do crente será acompanhada por sinais milagrosos e carismáticos”. Contudo, como forma de “compensar” tal perda, Camery-Hoggatt recorda que “esses sinais são atestados em outros lugares da Escritura e, talvez mais concretamente, na vida real da comunidade de fé”, pois, finaliza, “Deus não fracassou em se mover de forma redentora ou milagrosa”.2
Apesar de a posição de Camery-Hoggatt ser inflexível, ele faz uma observação importante que é o fato de que os sinais são atestados por outros textos bíblicos e, mais ainda, eles são uma realidade concreta na igreja. E isso é suficiente para fundamentar sua existência na contemporaneidade. A. Elwood Sanner, explica que essa porção escriturística marcana apresenta “o que se chama de ‘um dos maiores problemas textuais do Novo Testamento’”, pois os “dois manuscritos mais antigos e confiáveis (Vaticano e Sinaítico) omitem totalmente estes versículos, e encerram o Evangelho de Marcos em 16.8”, além de que tais “versículos também não aparecem em vários outros antigos manuscritos e também em algumas versões”.3 Contudo, pode-se questionar o porquê de tal texto constar, sem nenhum problema, nas versões bíblicas mais conhecidas (ARC, ARA, e entre colchetes na NTLH e TB, por exemplo). Tal se dá por conta de que estas traduções baseiam-se no chamado textus receptus, tradução do Novo Testamento, editada por Erasmo de Roterdã e “revisado por Stephanus [Roberto Estienne], que serviu de base para edições posteriores até meados do séc. XIX”.4 Sem mais alongar-se no assunto e acerca da referida tradução, é preciso dizer, com o mesmo Camery-Hoggatt, que tal se deu por conta do alargamento do que se “constitui um cânon autorizado da Escritura”: É este “‘uma lista de livros autorizados, no teor dos autógrafos’” ― dos textos saídos das mãos dos autores ― ou apenas as cópias dos originais? Sendo assim, apesar de algo não recomendado por Camery-Hoggatt, redefiniu-se “o significado do termo cânon para excluir a referência aos autógrafos e enfatizar o ‘texto recebido’ (textus receptus)”.6 Em termos diretos, embora se admita que o texto do “fim mais longo” não seja compatível com a linguagem e o estilo de Marcos, e que tal porção falte nos manuscritos mais antigos, encontrados posteriormente (por volta do século 17), isto é, após a consolidação do texto bizantino que, desde o final do terceiro século era utilizado por toda a cristandade e fonte para o textus receptus, diz Julio Barrera, o entendimento é que “esta passagem, conhecida já no século II por Justino e por Taciano, deve ser considerada parte do texto canônico de Mc”.7
Numa palavra, ainda que se admita que o texto seja “seja acréscimo de retalhos tomados de outros escritos do Novo Testamento, o trecho conserva o pensamento de Marcos, isto é: os discípulos devem continuar a ação de Jesus”.8 Assim, abordei essa questão apenas porque os cessacionistas utilizam tais argumentos para refutar o exercício evangelístico do movimento pentecostal que, desde sempre entendeu que levar a mensagem completa do Evangelho implica não apenas no anúncio, mas também, nos sinais que o acompanham. Não há dúvida que os que têm uma visão elevada da Escritura, ou seja, que a honram como Palavra de Deus, entendem que os milagres são também para os nossos dias, afinal, o texto bíblico diz claramente que “estes sinais seguirão aos que crerem” (v.17a). Tal promessa possui respaldo em outros textos das Escrituras, pois como lembra Craig Keener, “entre os sinais da era messiânica, Isaías predisse que os enfermos seriam curados, a língua dos mudos falaria (Is 35.5,6; contudo a ideia de línguas poderia ser uma referência aos eventos descritos em At 2.4 e 1Co 14) e o povo de Deus testemunharia a seu respeito (Is 43.10)”, pois os “poderes aqui atribuídos aos que creem são os mesmos que caracterizavam os profetas do Antigo Testamento”.9 Além do mais, tal tese de que o texto trata-se de um acréscimo tardio, longe de representar um problema para o pentecostalismo, revela um aspecto que reforça a importância do fato de tal texto ter sido “acrescentado” ao material de Marcos no segundo século. Se, como os versículos 17 e 18 deixam entrever, os “sinais” seguiriam aos que creem, e tais sinais cessaram com a morte do último apóstolo, ou com o encerramento do último autógrafo, não seria um perigo acrescentar tal texto quando tais prodígios já teriam desaparecido? Por que “acrescentar” uma porção bíblica que previa acontecimentos cuja experiência atual, naquele momento, já provaria sua inveracidade? Isto é, “o texto insiste na missão de levar o Evangelho ao mundo inteiro”, diz J. Delorme, “ligando estreitamente o testemunho da palavra e das obras aos sinais que o acompanham”.10 Portanto, se no segundo século, época em que de acordo com os especialistas tal texto foi incluído ao Evangelho de Marcos, tais sinais tivessem desaparecido, haveria necessidade de incluí-lo?
A única resposta coerente é que, para todos os que ouviam a leitura do Evangelho de Marcos, sobretudo após a inclusão dessa parte, o fato de essas manifestações acontecerem e causar admiração em uns e escândalo em outros, significa que tais práticas eram resultado normal da missão que eles estavam cumprindo, da mesma maneira como havia acontecido com os apóstolos que deram sequência ao ministério que lhes outorgara o Mestre (Mc 16.20). Em termos diretos, conquanto “Marcos tenha composto o Evangelho para uma congregação verdadeira e histórica”, diz Camery-Hoggatt, “para o crente pentecostal suas palavras de alguma maneira ainda soam inexplicavelmente verdadeiras”.11 E isso por uma razão muito simples: os pentecostais experimentam, em seus círculos, as mesmas maravilhas e prodígios que os destinatários originais de Marcos, bem como a Igreja do segundo século que lia o seu Evangelho no formato que temos em nossas Bíblias atualmente, isto é, eles se veem “dentro” da narrativa. Tal exercício é legítimo, inclusive, exegeticamente falando.12 O já citado Craig Keener diz que ao “enxertarmos a nossa vida na narrativa bíblica, tornamo-nos parte da extensão dessa narrativa”, justamente por isso, os “primeiros pentecostais muitas vezes enxergavam Atos 28 como inacabado, uma conclusão que hoje os críticos da narrativa geralmente têm reafirmado”.13 Tal se dá por uma razão muito simples, “a missão” outorgada pelo Senhor ainda encontra-se “inconclusa”, por isso, “continuamos precisando do poder do Espírito para concluí-la (At 1.8), e é exatamente esse poder que nos é prometido (2.39, evocando também a promessa de Deus em 1.4)”.14 Assim, “nós que damos continuidade à sua missão continuamos sendo parte da narrativa da história da salvação, uma narrativa (de nossa perspectiva pós-canônica) para a qual Atos aponta”.15 De forma análoga, o mesmo raciocínio aplica-se com a narrativa do “fim mais longo” de Marcos. E se o problema for com os sinais, tal questão não é nova, pois como instrui Craig Keener, “milagres fornecem um exemplo importante de situações em que abordagens epistêmicas divergentes levam a interpretações diametralmente opostas, tanto nas narrativas bíblicas como nas atuais”.16 O que está sendo dito, é que a “maneira de enxergarmos os milagres depende de nosso parâmetro interpretativo, a nossa fé” , ou seja, é algo decidido a priori e não depende só de “evidências”.
Portanto, se a cosmovisão do intérprete for cessacionista, ou antissobrenaturalista, nada o fará crer. Ninguém desabona a ideia de que é necessário discernimento e prudência quando se trata do miraculoso. Todavia, como oportunamente observa Craig Keener, há “céticos [que] levam [seu] ceticismo a extremos notáveis”.18 Como exemplo, o mesmo autor diz, como é lógico, que “de uma perspectiva médica, cataratas nos olhos não desaparecem imediatamente sem cirurgia”, não obstante, existem relatos do “desaparecimento instantâneo de cataratas após oração”. Assim, alguém que já decidiu não acreditar, rejeitará quaisquer fatos ou “afirmações que não combinam com a ‘realidade’ que construiu”, isto é, tais pessoas, “podem questionar a credibilidade das testemunhas, de vídeos ou até mesmo de documentação médica; ou elas podem explicar o evento de outro modo, como um evento natural que opera de acordo com princípios naturais ainda não compreendidos (e.g., poder psíquico)”. Tal é a posição, conforme foi dito no capítulo um, do teólogo reformado Simon Kistemaker. Keener diz conhecer “algumas das testemunhas de alguns desses relatos, e seria de esperar que o poder psíquico, se essa fosse a explicação, tivesse resultados mais coerentes (em contraste com a menos conhecida vontade de Deus como aquilo que os filósofos chamam de um agente inteligente e pessoal)”. A conclusão mais óbvia a que chegou o referido autor, é que “o fator comum em um grande número de relatos (em praticamente todos aqueles aos quais tive acesso) foi a oração em nome de Jesus”. E os exemplos não param por aí. Keener menciona casos de revivificação (ou “ressuscitação”), bem como de “coma profundo que parece ser morte”, e diz que estes geralmente “não se prestam facilmente a explicações psicossomáticas”. Ainda assim, o autor diz possuir “dez desses relatos testemunhados de perto por testemunhas oculares” em seu “próprio círculo de amigos e familiares”.19 Considerando que deparar-se com uma enormidade desses casos, por coincidência, seria algo realmente improvável, pergunta retoricamente Keener: “Com base na compreensão normal das probabilidades, não é mais racional pensar que a oração às vezes tem alguma relação com a recuperação?”20
Portanto, a ausência dos milagres em alguns locais não significa, absolutamente, que os prodígios divinos tenham cessado com a morte do último apóstolo. O que deve ser feito, com humildade, é buscar sinceramente diante de Deus a causa da inexistência do miraculoso entre si. Neste aspecto, a Bíblia oferece várias pistas. Ausência de fé e de oração e jejum (Mt 17.14-21), disputas teológicas e de poder (Mc 9.14,38-40), o não-compromisso e a falta de relacionamento com Deus (At 19.13-17), são apenas algumas delas. Não temo em dizer que muitos pentecostais estão optando pelo cessacionismo para justificar o desaparecimento dos milagres em suas comunidades de fé. Com isso, condescendem com a teologia reformada e buscam aprovação de quem, para os considerarem como “cristãos” exigem, tácita e debochadamente, que neguem a fé de expressão carismática. Outros, para serem aceitos nas academias, descreem das principais características do movimento simplesmente por conveniência. Neste vácuo, infelizmente, cresce o sincretismo religioso e um arremedo de péssimo gosto acaba confundido com o genuíno pentecostalismo. Por outro lado, mais importante que o milagre é ter o nome escrito nos céus, ou seja, a salvação (Lc 10.20). Compadecer-se das pessoas e vê-las como alvo do amor divino deve ser a maior motivação para que nos coloquemos à disposição de Deus a fim de sermos instrumentos dEle na esfera da operação de milagres. Tal disposição envolve não apenas o desejo de estar entre as multidões, mas também de ir para os locais de difícil acesso e de escassez de recursos, pois certamente aí é que o Senhor nos instrumentalizará ainda mais (At 8.5-13,26-40). Finalmente, é preciso entender que nem todos serão agraciados com o dom de operação de milagres, pois é justamente isso que Paulo diz aos crentes coríntios ao perguntar: “São todos operadores de milagres?” (1 Co 12.29). Evidentemente que a resposta é “não”. Portanto, nem todos serão instrumentos de Deus neste sentido como, por exemplo, o apóstolo Paulo fora (At 15.12; 19.11; 28.9; Rm 15.18,19 etc.). O importante é não perder de vista que Deus continua realizando milagres.
*Adquira o livro do trimestre de autoria de CARVALHO, César Moisés. Milagres de Jesus: A Fé Realizando o Impossível. 1 ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2018.
Que Deus o(a) abençoe.
Telma Bueno
Editora Responsável pela Revista Lições Bíblicas Jovens