segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Lição 13 - 4º Trimestre 2018 - Amizade: Uma Coisa Boa - Adolescentes.

Lição 13 - Amizade: Uma Coisa Boa 

4º Trimestre de 2018
ESBOÇO DA LIÇÃO
O AMOR COMO VÍNCULO DA AMIZADE
AMIZADE ONTEM E HOJE
É BOM FAZER AMIZADE
A CANÇÃO DO AMIGO
Claudionor de Andrade
“Apesar de tudo, hoje ela é a minha melhor amiga.” Foi o que me confessou, certa vez, um homem que, já entrado na segunda idade, amargava um divórcio de quase dois anos. Ao vê-lo tão abstraído, não pude evitar a pergunta. Precisou ele realmente repudiar aquela mulher, ainda primaveril e bela, para descobrir que, naqueles dezessete anos de vida em comum, tivera ao seu lado uma amiga incomum?
Pelo que inferi daquelas reticências, a esposa santificara-lhe um amor que ia além das fronteiras do coração. Ele, porém, desprezando a candeia que lindamente brilha na noite mais escura, preferiu a chama de uma paixão que, mesmo no dia mais claro, entenebra-se.
Mas a pergunta insistia: Pode o divórcio ressuscitar a amizade sobre a lápide do amor? 
Epitáfios, sim; afeição e apreço, jamais.
Quando jovem, ouvi um orador improvisar uns versos que me calaram na alma. Ao cinzelar a comunhão entre os cônjuges, aquele homem, já agrisalhado pela experiência, desabriu-se: “Que os namorados portem-se como velhos amigos. E que os casados vivam como eternos enamorados”. Até hoje não sei se a frase era sua ou se ele a tomou emprestada de algum cancioneiro medievo. Peregrina, soava-me aquela locução como um daqueles provérbios que adoçavam as canções de amigo da bela e distante Provença.
Quando os cônjuges fazem-se amigos
Enraizadas no folclore árabe e na rica poesia provençal, as canções de amigo enalteciam, doce e celicamente, as afeições do cavaleiro pela dama sempre amada. A geminação das almas era mais do que um matrimônio; externava-se numa amizade que as tornava gêmeas, idilicamente siamesas. Embora o autor dessas cantigas fosse um homem, o eu-lírico era uma mulher. E o bardo punha-se a traduzir em versos o que a bela e feliz dama esperava, em prosa, do cavaleiro que, brevemente, far-se-ia pai de seus filhos.
Nem sempre a dama era talhada por Fídias. Dom Quixote, porém, tinha os olhos ungidos por aquela beleza campesina e ainda adolescente. Sob o seu olhar, até o feio se alindava. Por isso, Dulcineia era-lhe deslumbrante. Assim, o Cavaleiro da Triste Figura dedica-lhe todos os triunfos de suas imaginadas batalhas. O seu amor, porém, era tão verdadeiro quanto o de Adão.
Adão, o poeta de Deus
Deus nos criou teólogos e poetas. Por um lado, não lhe podemos negar a existência, por nos haver incrustrado na alma a sua eternidade; por outro, não devemos destruir os poemas que seu o coração nos compõe.
Sim, Ele predestinou-nos à poesia, porque em versos formou Adão do pó da terra. O homem estava no Éden, mas o jardim ainda não era um paraíso: faltava-lhe Eva. Como haveria, pois, de trabalhar o jardim se este desfazia-se-lhe em desertos? Bastou, porém, um sono para que tudo mudasse. Dormiu agricultor, acordou poeta. Seus versos não são muitos; sua rima, inexistente. Mesmo assim, pequeno e quase imperceptível, o poema de Adão imortaliza-se no Gênesis: “Esta, afinal, é osso dos meus ossos e carne da minha carne; chamar-se-á varoa, porquanto do varão foi tomada” (Gn 2.23).
Só os japoneses conseguem versos tão exiguamente belos. Vem-me à memória, a propósito, um haicai composto por Mário Quintana que muito bem realça a sinonímia entre o amor e a amizade no matrimônio: “A amizade é um amor que nunca morre”. Ora, se jamais morre, por que tem de renascer sobre as cinzas de um amor que o divórcio matou? O casamento é dissolvido pela morte e pode ser desfeito pela infidelidade, mas o que vejo por aí é a dureza de coração desfazer o que Deus tão lindamente fez no Éden.
Adão, portanto, foi o primeiro a compor uma canção de amor. Não tinha armadura nem bandeira. Ele não era propriamente um cavaleiro, mas, perfeito cavalheiro que era, não temeu declarar o seu amor àquela dama que, por quase um milênio, seria a sua melhor amiga. Adão e Eva, uma união que os séculos não conseguiram destruir.
Um amor eternamente duradouro
Em seu Soneto de Fidelidade, Vinicius de Morais fala de um amor que jamais seria cantado por um poeta bíblico. Nas estrofes finais de seu belíssimo, mas triste poema, descreve um sentimento efemeramente eterno: “Que não seja imortal, posto que é chama/Mas que seja infinito enquanto dure”. Somente a paixão carnal e inconsequente pode aceitar semelhante paradoxo. O amor de Amnon por Tamar, por exemplo, era uma chama tão violenta que veio a incendiar todo o clã de Davi. Mas logo se extinguiu, porquanto chama. E o que parecia infinito acabou, quando o príncipe ultrajou sua meio-irmã.
O verdadeiro amor não se extingue no leito nupcial, pois nem o sepulcro pode destruí-lo. Ao descrever as venturas do matrimônio, Salomão foi além da poesia: “Põe-me como selo sobre o teu coração, como selo sobre o teu braço, porque o amor é forte como a morte, e duro como a sepultura, o ciúme; as suas brasas são brasas de fogo, são veementes labaredas. As muitas águas não poderiam apagar o amor, nem os rios, afogá-lo; ainda que alguém desse todos os bens da sua casa pelo amor, seria de todo desprezado” (Ct 8.7,8).
Vivendo as intensidades de um amor tão eternamente belo, o rei de Israel tem na esposa gentil não apenas uma amiga. Tem-na como irmã, pois entre ambos não havia apenas união de corpos, mas comunhão de almas: “Que belo é o teu amor, ó minha irmã, noiva minha! Quanto melhor é o teu amor do que o vinho, e o aroma dos teus unguentos do que toda sorte de especiarias!” (Ct 4.10). Mais adiante, declara o esposo: “Já entrei no meu jardim, minha irmã, noiva minha; colhi a minha mirra com a especiaria, comi o meu favo com o mel, bebi o meu vinho com o leite. Comei e bebei, amigos; bebei fartamente, ó amados” (Ct 5.1).
Cântico dos cânticos
Salomão não precisou repudiar Sulamita, para descobrir no coração da esposa a alma da amiga. A beleza da esposa far-se-ia outono, mas aquele amor não perdeu a primavera, pois soube como resistir tanto a calma do verão como os rigores do inverno. A canção do amigo, na vida do casal, versejou todas as estações.
Ao seu lado, esposo, está a sua melhor amiga, a única pessoa que, certamente, haverá de chorar em seu funeral.

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